TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS LIBERAIS
Segundo LIBÂNEO (1990), a pedagogia liberal
sustenta a idéia de que a escola tem por função preparar os indivíduos para o
desempenho de papéis sociais, de acordo com as aptidões individuais. Isso
pressupõe que o indivíduo precisa adaptar-se aos valores e normas vigentes na
sociedade de classe, através do desenvolvimento da cultura individual. Devido a
essa ênfase no aspecto cultural, as diferenças entre as classes sociais não são
consideradas, pois, embora a escola passe a difundir a idéia de igualdade
de oportunidades, não leva em conta a
desigualdade de condições.
TENDÊNCIA LIBERAL TRADICIONAL
Segundo esse quadro teórico, a tendência liberal
tradicional se caracteriza por acentuar o ensino humanístico, de cultura geral.
De acordo com essa escola tradicional, o aluno é educado para atingir sua plena
realização através de seu próprio esforço. Sendo assim, as diferenças de classe
social não são consideradas e toda a prática escolar não tem nenhuma relação
com o cotidiano do aluno.
Quanto aos pressupostos de aprendizagem, a idéia de
que o ensino consiste em repassar os conhecimentos para o espírito da criança é
acompanhada de outra: a de que a capacidade de assimilação da criança é idêntica à do adulto, sem levar
em conta as características próprias de cada idade. A criança é vista, assim, como um adulto em miniatura, apenas
menos desenvolvida.
No ensino da língua portuguesa, parte-se da
concepção que considera a linguagem como expressão do pensamento. Os seguidores
dessa corrente lingüística, em razão disso, preocupam-se com a organização
lógica do pensamento, o que presume a necessidade de regras do bem falar e do
bem escrever. Segundo essa concepção de linguagem, a Gramática Tradicional ou
Normativa se constitui no núcleo dessa visão do ensino da língua, pois vê nessa
gramática uma perspectiva de normatização lingüística, tomando como modelo de
norma culta as obras dos nossos grandes escritores clássicos. Portanto, saber
gramática, teoria gramatical, é a garantia de se chegar ao domínio da língua
oral ou escrita.
Assim, predomina, nessa tendência tradicional, o
ensino da gramática pela gramática, com ênfase nos exercícios repetitivos e de
recapitulação da matéria, exigindo uma atitude receptiva e mecânica do aluno.
Os conteúdos são organizados pelo professor, numa seqüência lógica, e a avaliação
é realizada através de provas escritas e exercícios de casa.
TENDÊNCIA LIBERAL RENOVADA PROGRESSIVISTA
Segundo essa perspectiva teórica de Libâneo, a
tendência liberal renovada (ou pragmatista) acentua o sentido da cultura como
desenvolvimento das aptidões individuais.
A escola continua, dessa forma, a preparar o aluno
para assumir seu papel na sociedade, adaptando as necessidades do educando ao
meio social, por isso ela deve imitar a vida. Se, na tendência liberal
tradicional, a atividade pedagógica estava centrada no professor, na escola
renovada progressivista, defende-se a idéia de “aprender fazendo”, portanto
centrada no aluno, valorizando as tentativas experimentais, a pesquisa, a
descoberta, o estudo do meio natural e social, etc, levando em conta os
interesses do aluno.
Como pressupostos de aprendizagem, aprender se
torna uma atividade de descoberta, é uma auto-aprendizagem, sendo o ambiente
apenas um meio estimulador. Só é retido aquilo que se incorpora à atividade do
aluno, através da descoberta pessoal; o que é incorporado passa a compor a
estrutura cognitiva para ser empregado em novas situações. É a tomada de
consciência, segundo Piaget.
No ensino da língua, essas idéias escolanovistas
não trouxeram maiores conseqüências, pois esbarraram na prática da tendência
liberal tradicional.
TENDÊNCIA LIBERAL RENOVADA NÃO-DIRETIVA
Acentua-se, nessa tendência, o papel da escola na
formação de atitudes, razão pela qual deve estar mais preocupada com os
problemas psicológicos do que com os pedagógicos ou sociais. Todo o esforço
deve visar a uma mudança dentro do indivíduo, ou seja, a uma adequação pessoal
às solicitações do ambiente.
Aprender é modificar suas próprias percepções.
Apenas se aprende o que estiver significativamente relacionado com essas
percepções. A retenção se dá pela relevância do aprendido em relação ao “eu”, o
que torna a avaliação escolar sem sentido, privilegiando-se a auto-avaliação.
Trata-se de um ensino centrado no aluno, sendo o professor apenas um
facilitador. No ensino da língua, tal como ocorreu com a corrente pragmatista,
as idéias da escola renovada não-diretiva, embora muito difundidas,
encontraram, também, uma barreira na prática da tendência liberal tradicional.
TENDÊNCIA LIBERAL TECNICISTA
A escola liberal tecnicista atua no aperfeiçoamento da ordem social vigente (o sistema
capitalista), articulando-se diretamente com o sistema produtivo; para tanto,
emprega a ciência da mudança de comportamento, ou seja, a tecnologia
comportamental. Seu interesse principal é, portanto, produzir indivíduos
“competentes” para o mercado de trabalho, não se preocupando com as mudanças
sociais.
Conforme MATUI (1988), a escola tecnicista, baseada
na teoria de aprendizagem S-R, vê o aluno como depositário passivo dos
conhecimentos, que devem ser acumulados na mente através de associações.
Skinner foi o expoente principal dessa corrente psicológica, também conhecida como
behaviorista. Segundo RICHTER (2000), a visão behaviorista acredita que
adquirimos uma língua por meio de imitação
e formação de hábitos, por isso a
ênfase na repetição, nos drills, na
instrução programada, para que o aluno for me “hábitos” do uso correto da
linguagem.
A partir da Reforma do Ensino, com a Lei 5.692/71,
que implantou a escola tecnicista no Brasil, preponderaram as influências do
estruturalismo lingüístico e a concepção de linguagem como instrumento de
comunicação. A língua – como diz TRAVAGLIA (1998) – é vista como um código, ou
seja, um conjunto de signos que se combinam segundo regras e que é capaz de
transmitir uma mensagem, informações de um emissor a um receptor. Portanto,
para os estruturalistas, saber a língua é, sobretudo, dominar o código.
No ensino da Língua Portuguesa, segundo essa
concepção de linguagem, o trabalho com
as estruturas lingüísticas, separadas do homem no seu contexto social, é visto como possibilidade de desenvolver a
expressão oral e escrita. A tendência tecnicista é, de certa forma, uma
modernização da escola tradicional e, apesar das contribuições teóricas do
estruturalismo, não conseguiu superar os equívocos apresentados pelo ensino da
língua centrado na gramática normativa. Em parte, esses problemas ocorreram
devido às dificuldades de o professor
assimilar as novas teorias sobre o ensino da língua materna.
TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS PROGRESSISTAS
Segundo Libâneo, a pedagogia progressista designa
as tendências que, partindo de uma análise crítica das realidades sociais,
sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da educação.
TENDÊNCIA PROGRESSISTA LIBERTADORA
As tendências progressistas libertadora e
libertária têm, em comum, a defesa da autogestão pedagógica e o antiautoritarismo.
A escola libertadora, também conhecida como a pedagogia de Paulo Freire,
vincula a educação à luta e organização de classe do oprimido. Segundo GADOTTI
(1988), Paulo Freire não considera o papel informativo, o ato de conhecimento na relação educativa, mas insiste que o
conhecimento não é suficiente se, ao lado e junto deste, não se elabora uma nova teoria do conhecimento e se os
oprimidos não podem adquirir uma nova estrutura
do conhecimento que lhes permita reelaborar e reordenar seus próprios
conhecimentos e apropriar-se de outros.
Assim, para Paulo Freire, no contexto da luta de
classes, o saber mais importante para o oprimido é a descoberta da sua situação
de oprimido, a condição para se libertar da exploração política e econômica,
através da elaboração da consciência crítica passo a passo com sua organização
de classe. Por isso, a pedagogia libertadora ultrapassa os limites da
pedagogia, situando-se também no campo da economia, da política e das ciências
sociais, conforme Gadotti.
Como pressuposto de aprendizagem, a força
motivadora deve decorrer da codificação de uma situação-problema que será
analisada criticamente, envolvendo o exercício da abstração, pelo qual se
procura alcançar, por meio de representações da realidade concreta, a razão de ser dos fatos. Assim, como afirma
Libâneo, aprender é um ato de conhecimento da realidade concreta, isto é, da
situação real vivida pelo educando, e só tem sentido se resulta de uma
aproximação crítica dessa realidade. Portanto o conhecimento que o educando
transfere representa uma resposta à situação de opressão a que se chega pelo
processo de compreensão, reflexão e crítica.
No ensino da Leitura, Paulo Freire, numa
entrevista, sintetiza sua idéia de dialogismo: “Eu vou ao texto carinhosamente.
De modo geral, simbolicamente, eu puxo uma cadeira e convido o autor, não
importa qual, a travar um diálogo comigo”.
TENDÊNCIA PROGRESSISTA LIBERTÁRIA
A escola progressista libertária parte do
pressuposto de que somente o vivido pelo educando é incorporado e utilizado em
situações novas, por isso o saber sistematizado só terá relevância se for
possível seu uso prático. A ênfase na aprendizagem informal, via grupo, e a negação de toda forma de repressão, visam
a favorecer o desenvolvimento de pessoas mais livres. No ensino da língua, procura valorizar o
texto produzido pelo aluno, além da negociação de sentidos na leitura.
TENDÊNCIA PROGRESSISTA CRÍTICO-SOCIAL DOS
CONTEÚDOS
Conforme Libâneo, a tendência progressista
crítico-social dos conteúdos, diferentemente da libertadora e libertária,
acentua a primazia dos conteúdos no seu confronto com as realidades sociais. A
atuação da escola consiste na preparação do aluno para o mundo adulto e suas
contradições, fornecendo-lhe um instrumental, por meio da aquisição de
conteúdos e da socialização, para uma participação organizada e ativa na
democratização da sociedade.
Na visão da pedagogia dos conteúdos, admite-se o
princípio da aprendizagem significativa, partindo do que o aluno já sabe. A transferência
da aprendizagem só se realiza no momento da síntese, isto é, quando o aluno
supera sua visão parcial e confusa e adquire uma visão mais clara e
unificadora.
TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS PÓS-LDB 9.394/96
Após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de n.º 9.394/96, revalorizam-se
as idéias de Piaget, Vygotsky e Wallon. Um dos pontos em comum entre esses
psicólogos é o fato de serem interacionistas, porque concebem o conhecimento
como resultado da ação que se passa entre o sujeito e um objeto. De acordo com
ARANHA (1998), o conhecimento não está, então, no sujeito, como queriam os
inatistas, nem no objeto, como diziam os empiristas, mas resulta da interação
entre ambos.
Para citar um exemplo no ensino da língua, segundo
essa perspectiva interacionista, a leitura como processo permite a
possibilidade de negociação de sentidos em sala de aula. O processo de leitura,
portanto, não é centrado no texto, ascendente, bottom-up, como queriam os empiristas, nem no receptor,
descendente, top-down, segundo os
inatistas, mas ascendente/descendente, ou seja, a partir de uma negociação de
sentido entre enunciador e receptor. Assim, nessa abordagem interacionista, o
receptor é retirado da sua condição de mero objeto do sentido do texto, de
alguém que estava ali para decifrá-lo,
decodificá-lo, como ocorria, tradicionalmente, no ensino da leitura.
As idéias desses psicólogos interacionistas vêm ao
encontro da concepção que considera a linguagem como forma de atuação sobre o
homem e o mundo e das modernas teorias sobre os estudos do texto, como a
Lingüística Textual, a Análise do Discurso, a Semântica Argumentativa e a
Pragmática, entre outros.
Delcio Barros da Silva
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofia da Educação. São Paulo :
Editora Moderna, 1998.
COSTA, Marisa Vorraber et al. O Currículo nos Limiares do
Contemporâneo. Rio de Janeiro : DP&A editora, 1999.
GADOTTI, Moacir.
Pensamento Pedagógico Brasileiro. São Paulo : Ática, 1988.
LIBÂNEO, José Carlos. Democratização
da Escola Pública. São Paulo :
Loyola, 1990.
MATUI, Jiron.
Construtivismo. São Paulo : Editora Moderna, 1998.
RICHTER, Marcos Gustavo. Ensino do Português e Interatividade. Santa Maria : Editora da UFSM, 2000.
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e Interação. São Paulo : Cortez, 1998.
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